Breve reflexão sobre identidades entrelaçadas

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Tenho visto mulheres negras ressaltar que vão escrever sobre o que acabaram de dizer, sobretudo quando se trata de ideia ou arranjo inovador. Entendo perfeitamente do que se trata, afinal nosso pensamento têm sido usurpado pela branquitude e em muitos casos, mal compreendido por nós mesmas.

Quero fazer o mesmo exercício aqui sobre isso, a diferença é que vou pensando enquanto escrevo. É meu modo de apresentar ideias, ainda que de maneira empírica. Nesse caso sobre a identidade e suas perspectivas, que algumas pessoas têm explicado de outro jeito, como lugares de fala.

Esses lugares de trânsito modificam também o corpo que atravessam e ao mesmo tempo que são atravessados. Porém, são como molduras. Quero falar de algo inferior que trata do interior desses corpos, das próprias características e física que os compõe. Não é sobre estar, mas sobre o estágio anterior do ser.

Preciso dizer que se você tem uma televisão, gosta de ciência, tem tempo e dinheiro para assistir televisão à cabo, além de um pouco de curiosidade para se interessar sobre astrofísica mas preguiça e ou falta de tempo e aptidão para estudá-la de fato, talvez se interesse por documentários sobre ciência como eu. Talvez conheça o símbolo nerd supremo, Neil deGrasse Tyson.

A estrela apresenta Cosmos, uma série muito bela em que se questiona qual será o caminho da humanidade daqui para frente. Tyson pega o bastão de Sagan, o apresentador da série original e supostamente um dos maiores cientistas do século, com paralelos que são inclusive contados na série.

Tyson é tão encantador que foi chamado de o astrofísico mais sensual do mundo. Ele faz com que por um segundo a gente acredite que a humanidade vai tomar um rumo de prosa diferente. Parar de jogar gás carbônico na atmosfera, usar agrotóxicos, respeitar as abelhas. É como se pudéssemos respirar ar puro por um segundo para depois acordar.

Porém… Há um detalhe que ainda não vi ninguém falar na biografia do cara, as acusações de violência sexual. A cientista e assistente Katelyn Allers conta ter sido submetida a uma interação não consentida, com o astro tocando uma tatuagem de maneira não apropriada. Porém há muito mais. Tchiya Amet El Maat acusa Tyson de ter aplicado um boa noite cinderela.

Esse é um daqueles casos em que a oposição entre oprimido e opressor são evidentes. Um entendimento têm sido cobrado de Tyson, uma vez que costuma usar o ideia de ser negro para entender o motivo de existirem tão poucas cientistas mulheres.

É como se opressor e oprimido estivessem emaranhados por um vetor que não pode ser destruído, como acontece na escala quântica. Como duas partículas geradas conjuntamente, interagindo ou se aproximando de tal modo que o estado de cada uma delas não pode ser descrito de maneira independente, não importa qual a distância entre elas.

Um dos aspectos interessantes dessa relação é que, por mais que se queira, a interferência em uma das partículas do sistema resulta em consequências para o todo. Os físicos têm se debruçado para entender porque isso acontece e como, uma vez que as interefências são sentidas imediatamente por todo o sistema, não importa a que distância as partes estejam uma da outra. Na prática, é como se a informação pudesse ser compartilhada numa velocidade superior a da luz, se pensarmos em partículas separadas por bilhões de anos luz.

Em termos de identidade, temos maior liberdade para imaginar cenários. Como disseram tantas pensadoras negras, não somos uma coisa só. Poderíamos facilmente pensar que a identidade é muito similar a um sistema quântico, em que nossos territórios de existência se aproximam ou não, mas os elementos que nos definem jamais deveriam ser tomados isoladamente.

Esse é um dos maiores compromissos da interseccionalidade, como acontece na vida. Por mais que a gente tente, vem com o pacote completo. Aquela doce figura da mulher branca delicada e oprimida, pode ser ao mesmo tempo uma escravocrata. Aquela mana daora, pode ser ao mesmo tempo uma tremenda de uma capacitista.

Um dos pontos interessantes sobre um sistema schrödingeriano é que ao observá-lo você interfere sobre o mesmo. É abrindo a caixa que a gente descobre se o gato está vivo ou morto, sendo a observação que determina o estado da matéria. O conceito é inclusive usado na criptografia quântica. Esse fenômeno observado na escala quântica pode ser aplicado à identidades emaranhadas, ouso imaginar. É quando a gente olha que as coisas se movem, os privilégios aparecem. Caso contrário, ficam lá, operando como se não tivessem nada a ver com isso.

O machista denominado Tyson é preto, o que não o isenta ou explica nada, muito pelo contrário. Toda e qualquer teoria que busque entender como opera, tem de dar conta de todas as suas facetas. Isso acontece com todo mundo, mesmo quem está nas margens ou fora delas. Como naquele episódio de Cosmos sobre o mundo plano, quando você acredita que uma dimensão não existe por não conseguir acessá-la…. Mas isso é outa estória.

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