Candyman como um pesadelo urbano

O monstro mais assustador do mundo são os seres humanos e tudo o que somos capazes, especialmente quando estamos juntos. Estou trabalhando nessas premissas sobre esses diferentes demônios sociais. Esses monstros inatamente humanos que fazem parte da maneira como pensamos e interagimos. Cada um dos meus filmes será sobre um desses diferentes demônios sociais.
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O monstro mais assustador do mundo são os seres humanos e tudo o que somos capazes, especialmente quando estamos juntos. Estou trabalhando nessas premissas sobre esses diferentes demônios sociais. Esses monstros inatamente humanos que fazem parte da maneira como pensamos e interagimos. Cada um dos meus filmes será sobre um desses diferentes demônios sociais.

JORDAN PEELE

É quase que impossível escapar da obra de Jordan Peele e de seu amor por histórias de suspense, terror e fantasia. E do convite que ele nos faz para pensar os demônios sociais de nossos tempos através de sua obra. Tenho certeza de que ainda não entendemos completamente todas as nuances de Corra e Nós.

Agora tem outro filme chega na praça.

Candyman (2021) foi produzido por Peele e dirigido por Nia da Costa, a pimeira mulher negra a liderar bilheteria de estreia nos Estados Unidos. O filme considerado por um crítico como “uma continuação inútil e pesadamente politizada de um clássico do terror” praticamente se pagou nos três primeiros dias. Um total de 22 milhões de dólares em plena pandemia e pavimentou o caminho da diretora rumo à direção de Capitã Marvel 2. Rá.

Hora de olhar para trás e assistir ao clássico Candyman (1992).

Candyman, o filme.

Candyman é inspirado no conto The Forbidden do inglês Clive Barker. A história se passa em Liverpool mas o diretor branco e inglês Bernard Rose se decidiu pela Chicago dos anos 80 após visitar a cidade e ficar impressionado pelo conjunto habitacional Cabrini-Green e suas narrativas de violência. Esse é o detalhe que explica muita coisa. Para lentes deterministas, aquele ambiente violento seria perfeito para um assassino em série negro e sobrenatural interpretado por Tony Todd.

A tensão entre o fantasma perturbado de um homem negro, que vaga numa vizinhança de baixa renda e deteriorada versus a jovem mulher branca e acadêmica que mora numa parte rica da cidade é o mote do filme. Candyman é assim a metáfora para um dos pesadelos mais assustadores da branquitude, a nossa presença nas cidades à partir da autoria de um homem branco, anotemos.

Na História do Urbanismo, a presença de populações indesejáveis é uma das questões ou problemas a que planejadores urbanos tem se dedicado longamente. Podemos traçar a genealogia desse pensamento até a Paris do século 18 e 19, se formos breves. Candyman em sua versão original e agora sua refilmagem é sobre um dos capitulos dessa estória, na Chicago do século XX.

Precisamos remontar a reconstrução da cidade de Chicago após o incêndio de 1871. Grande parte da cidade pegou fogo, uma excelente oportunidade para colocar em uso novas tecnologias de construção, como o ferro e quaisquer materiais que não pegassem fogo além de pensar e implementar de novos códigos e leis. Porém suas principais realizações não foram de ordem visual, com consequências duradouras: a guetificação da população negra por meio da substituição dos “velhos controles informais” por “mecanismos formais legais” alijaram parte de sua população com reflexos na cidade até os dia de hoje, como salientou Peter Hall.

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